Frente ao fenômeno atual do Great Resignation, em que vemos a saída voluntária das pessoas dos seus postos de trabalho em larga escala, e da OMS (Organização Mundial da Saúde) considerar burnout como uma doença ocupacional — um “estresse crônico de trabalho que não foi administrado com sucesso” —, vale a provocação: em que momento a experiência com o trabalho passou a ser tão negativa assim? O que exatamente estamos fazendo nos ambientes de trabalho para eles se transformarem em fontes de profundo estresse e frustração?
Talvez não seja o ambiente de trabalho que mudou, mas principalmente, nós mudamos. Durante anos, ainda que implicitamente, construímos a imagem do trabalhador ideal como aquele “guerreiro casca grossa”, totalmente devotado ao trabalho, sem grandes conflitos vida pessoal-trabalho e com uma capacidade homérica e inesgotável de fazer entregas. Na mesma linha, de uma forma ou de outra, nutrimos uma certa glamourização da sobrecarga de trabalho com mantras como: “aqui temos horário para entrar, mas não para sair” e, sem perceber, passamos a exibir sobrecarga, sacrifício e estresse como “medalhas de honra”.
Não era raro notar um certo orgulho enrustido das pessoas ao comentar sobre uma rotina de trabalho que avançava regularmente pela madrugada, pelos finais de semana e que normalizou estar atolado de responsabilidades e demandas. Quase como sinal de maior status. Quem se afastasse deste ideal de profissional, seria estigmatizado então como de menor potencial ou até mesmo menos comprometido. E, em culturas no estilo “tropa de elite — pede para sair” ou “não sabe brincar, não desce para o play”, quem não estivesse disposto a jogar este jogo, de fato deveria se desligar ou ser desligado.
Isso não significa que estas novas prioridades gerariam ambientes de trabalho lenientes. É um falso dilema colocar alta performance e equilíbrio vida pessoal-trabalho como antagônicos. Estas novas preferências apenas acendem um alerta sobre a necessidade de se fazer uma autocrítica sobre o que se pede e o quê se oferece no ambiente de trabalho. A lógica é simples. Na mesma medida em que um ambiente de trabalho apresenta altas demandas de trabalho ao colaborador, mais este mesmo ambiente de trabalho precisa prover os recursos de trabalho necessários e proporcionais a ele para que o trabalho seja realizado e as demandas atendidas.
Ou seja, as metas estabelecidas são agressivas, o trabalho é complexo e há altas expectativas de entregas? Então, este mesmo “sarrafo” elevado para estabelecer as demandas ao trabalhador precisa também nortear a qualidade e quantidade de recursos que a organização coloca à disposição deste mesmo trabalhador.
Quais recursos? Todos aqueles que nos permitem não apenas entregar o resultado, como estimule crescimento e desenvolvimento, sem nos exaurir no caminho. Isso significa que recursos incluem não apenas os óbvios físicos e tecnológicos, mas especialmente, englobam também outros menos salientes como: clareza sobre o que o colaborador precisa alcançar, tempo, feedback, capacitação, reconhecimento e até o suporte de colegas e, especialmente, de lideranças.
Mesmo um projeto estimulante, repleto de propósito e senso de impacto, pode se transformar em um grande estressor no trabalho. Um desafio no trabalho, quando não estiver acompanhado dos recursos necessários, deixa de ser experimentado como um desafio para se tornar apenas mais um fardo a se carregar. Ou seja, o que causa exaustão no trabalho não é apenas a demanda de trabalho em si, mas a falta de recursos para atender a estas demandas.
E, aqui, vale fazer as provocações: que recursos você vem oferecendo ao seu time? Qual a qualidade deles? Todas as pessoas do time têm mesmo acesso a estes recursos? Estão estes recursos à altura das demandas que você faz? As respostas a estas perguntas darão uma boa medida do nível de engajamento ou de exaustão do seu time. Assim, não se furte de respondê-las!