É comum exaltarmos o Brasil por sua pluralidade cultural. Por aqui, o convívio de pessoas de todas as crenças, etnias, gêneros e orientação sexual é muito bonito na teoria, porém a realidade é bem menos agradável: o Brasil ainda é um país cheio de preconceitos. A falta de diversidade nas empresas ainda é uma realidade latente e nós precisamos falar sobre.
As mulheres — principalmente negras —, as pessoas com deficiência, a comunidade LGBTI+ e as pessoas negras sofrem para conquistar o seu espaço dentro do ambiente de trabalho. Embora tenham avançado, as ações de diversidade e inclusão nas organizações ainda precisam do engajamento da liderança, conforme aponta o Relatório de Tendências de Gestão de Pessoas 2024.
O que é diversidade e inclusão?
A palavra diversidade remete a tudo aquilo que é diferente, plural. Trata-se de uma multiplicidade cultural, étnica, social e linguística. Ou seja, a diversidade contempla todas as pessoas e, ao falarmos de Diversidade e Inclusão (D&I), estamos abordando as práticas voltadas aos grupos sociais minorizados.
A palavra inclusão, por sua vez, refere-se incorporação de pessoas na sociedade de forma equitativa. Tem como objetivo garantir que as pessoas de toda a variedade de gênero, etnia, deficiência, idade, orientação sexual possam fazer parte dos espaços públicos e privados.
Dentro das organizações o setor de Diversidade e Inclusão é responsável por promover atividades afirmativas de inclusão dessas pessoas que compõem o grupo minorizado socialmente.
Quem são os grupos minorizados na sociedade?
No contexto de cenário brasileiro, advindo de estruturas sociais pautadas pelo colonialismo, as pessoas que compõem os grupos minorizados socialmente são:
- etnia: pessoas de diferentes raças e culturas, principalmente, negras e indígenas;
- gênero: pessoas que se identificam como mulheres ou pessoas trans;
- idade: pessoas com mais de 50 anos de idade, as quais muitas vezes estão excluídas do mercado de trabalho;
- orientação sexual: pessoas que compõem a comunidade LGBTI+ — lésbicas, gays, bissexuais, trans, intersex, pansexuais e muito mais;
- pessoas com deficiência: pessoas com deficiência física/motora, intelectual, cognitiva, sensorial e outras.
Esses grupos, embora possam representar a maioria numérica no Brasil — no caso das mulheres e pessoas pretas e pardas — ainda sofrem com a segregação e o preconceito.
A falta de diversidade de gênero nas empresas
A presença das mulheres no mercado de trabalho é uma constante evolução. Os últimos anos tem promovido mudanças significativas nesse cenário, mas ainda assim há muitas que estão fora do mercado tradicional — empregos informais e sem os direitos trabalhistas.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra por Domicílio (Pnad), 2023 fechou com o maior número de pessoas trabalhando desde o ano de 2012 em território brasileiro. A presença feminina totalizou mais de 43 milhões, um recorde para o cenário brasileiro. A ocupação das mulheres negras cresceu 2,5%, o que representa 565 mil novas funcionárias.
Entretanto, esse número ainda é menor do que a presença masculina (proporcionalmente) e, além disso, as mulheres ainda convivem com o cenário de receberem um salário menor do que os homens mesmo desempenham funções semelhantes.
A presença feminina nas Melhores Empresas Para Trabalhar 2023
Se pegarmos o recorte do universo das 150 Melhores Empresas Para Trabalhar no Brasil, estamos mais próximos da igualdade — se olharmos em um nível superficial. Desde 2020, a presença feminina nessas organizações representam uma variação de 45 a 47%.
Ainda falando sobre gênero, destaca-se a presença de 1% das pessoas que afirmam não contemplar o gênero masculino e feminino dentre o universo de funcionários destas Melhores Empresas Para Trabalhar. Esse cenário contempla pessoas não-binárias, agêneras e outras identificações.
Embora as Melhores Empresas Para Trabalhar apontem para um caminho de maior presença feminina, percebemos que não há uma distribuição equilizante entre os gêneros binários — feminino e masculino. Isso aponta que a equiparação de gênero também é um desafio para essas instituições.
Mulheres em cargos de alta gestão
Quanto mais alto na hierarquia das empresas, mais escassa se torna a participação das mulheres. E, aqui, ouvimos todos os tipos de desculpa para não ter profissionais do gênero feminino na alta liderança: é alegado que elas estão menos dispostas à mobilidade, que podem se afastar por longos períodos de tempo por conta de gravidez, e até argumentos absurdos como mulheres transmitem menos credibilidade que homens para investidores que são, em sua grande maioria, (adivinhem?) homens.
Em 2023, dados do Ranking Mulher — que premia organizações que trabalham fortemente para a promoção de igualdade de gênero — aponta para a queda da presença feminina na alta e média gestão.
Apesar dessa realidade, em 2023, o número de mulheres CEO’s nas Melhores Empresas Para Trabalhar – Ranking Mulheres cresceu de 10% (em 2022) para 16%. Isso mostra que há sim alternativas para o crescimento.
A falta de diversidade étnico racial nas empresas
Falando em ignorância, já passou da hora de desmistificar um dos principais argumentos para a desigualdade étnica no trabalho:
“existem menos pardos e negros nas lideranças das empresas porque trata-se de uma população mais pobre e que, portanto, tem menos acesso à educação”.
Em primeiro lugar, isso não é justificativa; é mais um ponto que mostra que há algo em nossa sociedade que precisa ser melhorado imediatamente! E, para os que continuam negando a realidade, vamos aceitar esse argumento (inaceitável) por um minuto, só para mostrar que ainda assim, ele não se sustenta.
Segundo dados do IBGE, no Brasil, pretos e pardos compõem 56% da população. Essa representatividade sobe para 71% entre aqueles que estão abaixo da linha da pobreza e para 73% entre os que estão em extrema pobreza. Esses números evidenciam a disparidade racial no Brasil quando comparados aos 27% de brancos pobres e 25% em extrema pobreza.
Pessoas negras são marginalizadas em nossa história há anos, sendo obrigadas a informalidade no trabalho, 43% dos prestos e 47% dos pardos estão empregados informalmente. Números muito superior aos 32% de brancos nesse cenário.
A pesquisa do DIEESE, que mostra que a diferença salarial entre brancos e negros na indústria e no comércio passa de pouco menos de 20% (a mais para os brancos, obviamente) entre funcionários sem o Ensino Fundamental para quase 40% entre funcionários com Ensino Superior.
A presença de pessoas negras nas Melhores Empresas Para Trabalhar
O Ranking Étnico Racial é um dos rankings de diversidade do GPTW. Ele nasceu com o objetivo de premiar as organizações que promovem ações ativas para diminuir a distância social entre pessoas negras e pardas das pessoas brancas.
É um cenário muito difícil de ser equiparado, principalmente se olharmos para o cenário das mulheres negras que sofrem duplo preconceito: a de gênero e a de raça.
Dentre as Melhores Empresas Para Trabalhar — Ranking Etnico Racial 2023, 21% das lideranças é composta por pessoas negras. Um cenário atípico, visto que a presença de brancos em cargos de liderança no mercado brasileiro chega a ser até 49 vezes maior.
Práticas das Melhores Empresas Para Pessoas Pretas e Pardas Trabalharem 2023
Para equiparar o cenário de desigualdade racial no Brasil, as empresas premiadas pelo Great Place To Work promovem diversas ações afirmativas voltadas para a comunidade negra.
Dentre as ações estão:
- metas claras de diversidade e inclusão para toda a organização voltada para a temática racial;
- políticas inclusivas para contratações específicas;
- profissionais capacitados para encabeçar práticas na temática étnico racial;
- a exigência para fornecedores e terceiros para que sigam os mesmos princípios de diversidade da organização.
A falta de diversidade LGBTI+ nas empresas
A empresa de recrutamento e seleção, Elancers, realizou uma pesquisa com recrutadores que revelou que 7% das empresas não contratariam um candidato homossexual em hipótese alguma, e 11% só contratariam se o candidato jamais pudesse chegar a um cargo de visibilidade, como executivo.
Ou seja, se você é homossexual e quer ter um emprego com perspectivas de crescimento, uma em cada cinco empresas do país não é para você. E não é só aqui no Brasil!
A Universidade de Harvard conduziu um experimento em que enviou currículos praticamente idênticos para cerca de 1.700 recrutadores, com apenas uma pequena diferença: em metade desses currículos, também foi adicionado que o candidato teve experiência como tesoureiro do grupo LGBTI+ da faculdade.
O resultado? Quatro vezes mais convites para uma entrevista entre os recrutadores que receberam o currículo sem a informação. E os problemas não param na contratação: a pesquisa LGBT Out Now mostrou que no Brasil apenas 3 entre 10 executivos gays falam abertamente sobre sua orientação sexual com colegas de trabalho. Sinal de que eles têm medo de sofrer consequências caso o seu “segredo” seja descoberto.
Isso impacta também no bolso das empresas: a mesma pesquisa mostra que entre funcionários homossexuais assumidos, 75% afirmam sentirem-se produtivos. Entre os não assumidos, o número cai para 46%. E o motivo é óbvio: fica difícil conseguir se dedicar completamente ao trabalho quando a maior parte do seu foco está voltado em precisar fingir ser alguém diferente do que se é.
A realidade de pessoas trans no mercado de trabalho
No cenário das pessoas trans, há poucas esperanças de sequer arrumar algum espaço no mercado de trabalho, ainda mais um trabalho decente com qualquer tipo de perspectiva. O que, é claro, tem consequências graves: segundo a ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transexuais, 90% de travestis e transexuais recorrem à prostituição como forma de se sustentar.
Em 2023, a oferta de empregos para profissionais trans caiu em 57% se comparado ao ano anterior. A prática de políticas afirmativas que promovam a empregabilidade trans precisa ser uma realidade nos programas de Diversidade e Inclusão das organizações.
Para as Melhores Empresas Para Trabalhar — Ranking LGBTI+, o cenário de práticas são a seguinte:
- 88% das premiadas oferecem um planejamento de metas claras para toda a organização sobre a temática LGBTI+;
- 96% das empresas premiadas adotam políticas inclusivas para as contratações.
O que a falta de diversidade promove nas empresas?
A falta de diversidade nas empresas promove problemas sociais, de relacionamento e também falta de capacidade de inovação. Os prejuízos podem afetar o clima organizacional, aumentar a rotatividade e diminuir o desejo de permanência dos funcionários.
Além disso, as pessoas estão cada vez mais associadas não apenas aos produtos e serviços das marcas, mas também o papel social que elas desempenham. A falta de diversidade demonstra que a sua organização não está preocupada em promover igualdade e justiça social, aumento a descrença dos clientes com a marca.
Preconceitos
Em um ambiente sem pluralidade, há o predomínio de antigas e superadas formas de pensar. Chega de falar que no Brasil não tem machismo, racismo, capacitismo, etarismo ou homofobia. Tem tudo isso, e em doses alarmantes — dentro e fora do ambiente de trabalho.
Espaços sem diversidade tornam-se ambientes nos quais os preconceitos ganham força, o discurso de ódio toma conta. Isso afeta o clima organizacional, deixando nocivo para outras pessoas.
Essa falta de diversidade também torna difícil o contato com os clientes, afinal, na sociedade brasileira a diversidade está presente. A empresa, portanto, torna-se uma ilha, isolada da realidade social no país.
Dificuldade para inovação
A inovação é um caminho promovido por aqueles que pensam fora da caixa. As pessoas estão mais aptas a inovarem em espaços que há diversidade de ideias, pensamentos, vivências e realidades. É a partir dessa pluralidade que vai nascer os pensamentos mais inovadores.
Uma empresa sem diversidade fica estagnada, presa a antigas ordens e regras. Essa incapacidade de quebrar os preconceitos e pensar em maneiras diferentes de fazer o trabalho, faz com que perca espaço dentro do mercado.
Conflitos entre as pessoas
Uma empresa que tem resistência para a diversidade está fadada aos conflitos internos. Isso acontece porque não há como evitar que as pessoas sejam diversas, isso já é uma realidade no país.
Mesmo que uma instituição tente contar com funcionários padrões, haverá diversidade de pensamentos e vivências dentro deles. As pessoas são vivas e, portanto, pensam e se articulam de maneiras diferentes. A falta de diversidade é uma pólvora, prontinha para fazer os conflitos explodirem.
Os benefícios da diversidade para a empresa
As empresas que promovem a diversidade em sua rede de funcionários, contará com benefícios múltiplos. Como falamos, até os clientes são impactados positivamente pela inclusão de grupos minorizados na organização.
- bem-estar social: a inclusão de diversidade diminui a vulnerabilidade social de pessoas marginalizadas, promovendo dignidade;
- engajamento: os funcionários sentem-se mais pertencentes e engajam mais nas ações de empresas mais diversas;
- redução do turnover: o desejo de permanecer em uma empresa que promove o respeito e a igualdade é maior;
- relação com os clientes: as pessoas buscam produtos e serviços de empresas engajadas nas questões sociais.
Não há mais desculpas para a falta de diversidade nas empresas. Esse cenário de retrocesso social precisa ser superado para garantir ganhos cada vez maiores para a sociedade e para as organizações.
Aproveite a visita e confira a íntegra do Estudo das Melhores Empresas Para Trabalhar — Ranking Diversidade 2023. Inspire-se nas práticas e ações das organizações que promovem a diversidade e inclusão.
2 Comentários
O grupo para troca foi criado? Queria muito participar! Obrigada!!!
Vanessa, não temos um grupo, mas você pode ler mais conteúdos sobre diversidade aqui: https://gptw.com.br/?s=DIVERSIDADE